DECLARAÇÃO DA COMISSÃO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS POR OCASIÃO DO DIA INTERNACIONAL DO ABORTO SEGURO

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DECLARAÇÃO DA COMISSÃO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS POR OCASIÃO DO DIA INTERNACIONAL DO ABORTO SEGURO

Banjul, Gâmbia, 28 de setembro de 2025 – Por ocasião do Dia Internacional do Aborto Seguro, celebrado globalmente em 28 de setembro, a Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (CADHP) destaca a mensagem central e urgente do tema de 2025: "O aborto seguro é um cuidado de saúde que salva vidas".

Em todo o continente, o aborto inseguro permanece uma devastadora crise de saúde pública e uma grave violação dos direitos humanos. Constitui uma das principais causas de mortalidade e morbilidade materna, privando África das suas mulheres e raparigas e deixando famílias e comunidades destroçadas. Cada morte e cada lesão resultante de um procedimento inseguro representam uma tragédia evitável, refletindo a falha em proteger direitos fundamentais — à vida, à saúde, à não discriminação e à autonomia corporal — tal como consagrados na Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e no Protocolo à Carta Africana dos Direitos das Mulheres em África (Protocolo de Maputo).

O Protocolo de Maputo, enquanto instrumento jurídico inovador, prevê expressamente n alínea c) do n. º 2 do artigo 14.º, que os Estados Partes devem “proteger os direitos reprodutivos das mulheres, autorizando o aborto médico em casos de agressão sexual, violação, incesto e quando a continuação da gravidez colocar em risco a saúde mental e física da mãe, ou a vida da mãe ou do feto”.

Esta disposição não constitui uma mera recomendação: trata-se de uma obrigação legal, fundada no reconhecimento de que a negação de serviços de aborto seguro acarreta consequências fatais.

O tema “O aborto seguro é um cuidado de saúde que salva vidas” impele-nos a encarar esta questão sob a perspetiva correta. O acesso ao aborto seguro não deve ser visto como objeto de disputa política ou ideológica; trata-se de uma componente essencial dos cuidados de saúde reprodutiva abrangentes. É tão vital quanto uma transfusão de sangue, uma cesariana de emergência ou um tratamento contra a malária. Quando os quadros jurídicos e médicos restringem o acesso a serviços seguros, não eliminam o aborto; apenas forçam mulheres e raparigas a recorrer a alternativas perigosas, perpetuando um ciclo de sofrimento e morte.

Por conseguinte, a CADHP apela a todos os Estados-Membros da União Africana para:

1. Ratificar, Domesticar e Implementar o Protocolo de Maputo: Apela aos Estados não ratificantes para que ratifiquem imediatamente. Para os Estados que são partes, exortamos à domesticação plena e implementação efectiva do Artigo 14.º do Protocolo de Maputo, exigindo a remoção concreta de todas as barreiras legais e políticas que negam às mulheres o acesso aos seus direitos garantidos.

2. Retirar as reservas a alínea c) do nº 2 do artigo 14º do Protocolo de Maputo: Exorta os Estados que formularam reservas ao artigo 14º e, especificamente, a alínea c) do nº 2 do artigo 14º a retirarem as suas reservas e a aplicarem integralmente a disposição do Protocolo de Maputo.

3. Aprovar reformas legais para descriminalizar o aborto: Exorta os Estados a tomar medidas imediatas para revogar as leis que criminalizam o aborto, acabando assim com a perseguição e prisão de mulheres, raparigas e profissionais de saúde por procurarem ou prestarem cuidados médicos essenciais.

4. Garantir o acesso aos sistemas de saúde pública: Exorta os Estados a integrar o aborto seguro e os cuidados pós-aborto abrangentes como serviços essenciais e acessíveis nos sistemas nacionais de saúde. Estes serviços devem ser acessíveis, confidenciais e não discriminatórios, com um foco específico em chegar aos mais vulneráveis, incluindo raparigas adolescentes, refugiadas e mulheres que vivem na pobreza.

5. Desmantelar o estigma através da educação e da informação: Exorta os Estados a liderar campanhas robustas de saúde pública para combater o estigma e dissipar a desinformação. Tal inclui garantir o acesso a uma educação sexual abrangente e baseada em dados concretos, para que as mulheres e as raparigas possam tomar decisões informadas sobre o seu corpo e a sua saúde.

6. Proteger os prestadores de cuidados de saúde: Exorta os Estados a proteger os profissionais de saúde contra intimidação, assédio ou retaliação legal por prestarem cuidados seguros. Exorta os Estados a fornecer serviços de aborto legal com cuidados pós-aborto, bem como garantir um ambiente seguro para pacientes e fornecedores.

Neste dia, a CADHP presta homenagem às vidas perdidas e aos problemas de saúde resultantes do aborto inseguro. Expressamos a nossa solidariedade para com as corajosas mulheres, raparigas e defensores em toda a África que lutam incansavelmente pelo direito a cuidados de saúde seguros. A CADHP, através do mandato da sua Relatora Especial sobre os Direitos da Mulher e da Rapariga, reafirma o seu empenho em colaborar com os Estados-Membros, as Instituições Nacionais de Direitos Humanos e a sociedade civil para assegurar que todas as mulheres e raparigas em África possam exercer plenamente o seu direito à vida, à saúde e à dignidade.

O aborto seguro é saúde. E os cuidados de saúde são um direito humano!

Ilustre Comissária Janet Ramatoulie Sallah-Njie

Relatora Especial para os Direitos da Mulher em África e Vice-Presidente da CADHP