Resolução sobre a justiça para as vítimas de violações graves e massiças dos direitos humanos e de crimes internacionais na República Democrática do Congo desde 1997 - CADHP/Res.643 (LXXXV) 2025

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A Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos («a Comissão»), reunida na sua 85.ª Sessão Ordinária, realizada de 7 a 30 de Outubro de 2025, em Banjul, República da Gâmbia, 

CONSIDERANDO o seu mandato de promoção e proteção dos direitos humanos e dos povos em África, nos termos do artigo 45.º da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (a Carta Africana)

RECORDANDO que um dos objectivos fundamentais da União Africana, conforme previsto na alínea f) do Artigo 3.º do seu Acto Constitutivo, propõe-se assegurar a «promoção da paz, da segurança e da estabilidade no continente»; 

RECORDANDO TAMBÉM que o lema do ano da União Africana identifica as «reparações» como componente essencial da «justiça»;

REFERINDO-SE à Política de Justiça Transicional da União Africana (AUTJP) adotada em 12 de fevereiro de 2019 durante a 32ª sessão ordinária da Conferência da UA em Adis Abeba, Etiópia, e ao Estudo da Comissão sobre Justiça Transicional e Direitos Humanos e dos Povos em África, adotado durante a sua 24.ª sessão extraordinária, realizada em Banjul, na Gâmbia, de 30 de julho a 8 de agosto de 2018, em conformidade com a Resolução CADHP/Res.235 (LIII)2013 sobre a justiça transicional em África (adotada na sua 53.ª Sessão Ordinária, realizada em Banjul, na Gâmbia, de 9 a 23 de abril de 2013);

CONSIDERANDO os Artigos 22.º e 23.º da Carta Africana, que consagram os direitos à segurança, à paz e ao desenvolvimento, bem como outros instrumentos jurídicos regionais e internacionais relevantes em matéria de direitos humanos;

CONSIDERANDO AINDA os Artigos 58.º e 60.º da Carta Africana, que conferem à Comissão a responsabilidade de se pronunciar sobre violações graves e massivas dos direitos humanos e dos povos, inspirando-se no direito internacional dos direitos humanos;

CONSIDERANDO, ALÉM DISSO, os artigos 10.º e 11.º do Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos relativo aos direitos das mulheres (Protocolo de Maputo), que garantem às mulheres o direito à paz e à proteção em conflitos armados;

CIENTE da Comunicação 277/99, República Democrática do Congo c. Burundi, Ruanda e Uganda; 

CIENTE TAMBÉM das suas resoluções anteriores sobre a situação dos direitos humanos na República Democrática do Congo, que reconhecem e condenam crimes internacionais, bem como violações graves e massivas dos direitos humanos, actos de violência contra populações civis e actos específicos de violência sexual e baseada no género; De modo particular, a Resolução ACHPR/Res.139(XXXXIV)08 de 24 de Novembro de 2008; a Resolução ACHPR/Res.173(XLVIII)10 de 24 de Novembro de 2010; a Resolução ACHPR/Res.241(EXT.OS/XIV)2013 de 24 de Julho de 2013; a Resolução ACHPR/Res.284(LV)2014 de 12 de Maio de 2014; a Resolução ACHPR/Res.424(EXT.OS/XXVI)2019 de 30 de Julho de 2019; e a Resolução ACHPR/Res.627(LXXXII)2025 de 11 de Março de 2025;

TENDO EM CONTA a Resolução CADHP/Res.428(LXV)2019 sobre a situação dos direitos humanos na República do Sudão do Sul, adotada durante a sua 65.ªª Sessão Ordinária, realizada de 21 de outubro a 10 de novembro de 2019, em Banjul, na Gâmbia, e que exigia que o país implementasse um processo de justiça transicional em conformidade com a AUTJP e o Estudo da Comissão sobre Justiça Transicional e Direitos Humanos e dos Povos em África;

CONSIDERANDO o Relatório da Missão Conjunta (Nações Unidas) encarregada de investigar alegações de massacres e outras violações dos direitos humanos ocorridas no leste do Zaire (actual República Democrática do Congo) desde Setembro de 1996 (A/51/941), parágrafo 1; 

CONSIDERANDO AINDA o Relatório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, intitulado «Relatório sobre o Exercício de Mapeamento que documenta as violações mais graves dos direitos humanos e do direito internacional humanitário cometidas no território da República Democrática do Congo entre Março de 1993 e Junho de 2003 (Agosto de 2010), em particular, os parágrafos 233 e 510–516, que estabelecem, para além de qualquer dúvida razoável, a ocorrência de «actos de genocídio», a existência de «elementos inculpatórios», a «premeditação» e a implementação de uma «metodologia ou plano genocida» no decurso dos massacres sistemáticos perpetrados no território da República Democrática do Congo;

POR FIM, CONSIDERANDO os vários Relatórios elaborados pelos Grupos de Peritos das Nações Unidas referentes à República Democrática do Congo, mandatados pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas no período compreendido entre 2004 e 2025: S/2004/551, S/2005/30, S/2005/436, S/2006/525, S/2007/40, S/2007/423, S/2008/43, S/2008/772, S/2008/773, S/2009/253, S/2009/603, S/2010/252, S/2010/596, S/2011/345, S/2011/738, S/2012/348, S/2012/348/Add.1, S/2012/843, S/2013/433, S/2014/42, S/2014/428, S/2015/19, S/2015/797, S/2016/466, S/2016/1102, S/2017/672, S/2017/1091, S/2018/531, S/2018/1133, S/2019/469, S/2019/974, S/2020/48, S/2021/1104, S/2022/479, S/2022/967, S/2023/431, S/2023/990, S/2024/432, S/2024/969 e S/2025/446; 

TENDO EM CONTA as recomendações formuladas durante a Nona Edição do Fórum sobre Justiça de Transição, realizada de 30 de Setembro a 2 de Outubro de 2025, organizada conjuntamente pela União Africana e pelo Governo da República Democrática do Congo (Ministério dos Direitos Humanos, Fundo Nacional de Reparações para as Vítimas de Violência Sexual Relacionada com Conflitos e para as Vítimas de Crimes contra a Paz e a Segurança da Humanidade (FONAREV), e da Comissão Interinstitucional de Apoio às Vítimas e de Apoio às Reformas (CIA-VAR));

CONSIDERANDO A URGÊNCIA de fazer justiça às diferentes vítimas destas graves violações e crimes internacionais após mais de 30 anos de sofrimento;

A Comissão:
1.    CONDENA VEEMENTEMENTE cada uma das violações graves e massivas dos direitos humanos e dos povos, bem como cada um dos crimes internacionais, incluindo genocídio, cometidos na República Democrática do Congo por actores estatais e não estatais, ou por todas as partes envolvidas nos conflitos, desde a sua eclosão até à presente data;
2.    RELEMBRA que incumbe ao Governo da República Democrática do Congo a responsabilidade primordial de garantir a segurança em todo o território nacional e de assegurar a protecção efectiva dos seus cidadãos e de todas as pessoas sob a sua jurisdição, nomeadamente através da instauração de inquéritos exaustivos e da adopção de todos os procedimentos judiciais adequados à responsabilização penal pelas violações graves e actos que constituem crimes internacionais;
3.    EXORTA o Governo da República Democrática do Congo a adoptarem todas as medidas necessárias, em colaboração com a União Africana e os demais intervenientes relevantes, para garantir justiça às vítimas, incluindo, mas não se limitando, à implementação efectiva de mecanismos de justiça de transição, alicerçados nos seus pilares fundamentais, nomeadamente, o direito à verdade, o direito à justiça, o direito à reparação e a garantia de não reincidência; e em conformidade com a Política de Justiça Transicional da União Africana (AUTJP), o Estudo sobre Justiça Transicional e Direitos Humanos e dos Povos em África.
4.    DECIDE, em conformidade com o seu mandato de protecção ao abrigo do Artigo 45.º e do disposto no Artigo 46.º da Carta Africana, realizar uma audiência sobre a situação, com vista ao desenvolvimento de um processo eficaz de justiça e responsabilização para as vítimas dessas violações e crimes.

Banjul, aos 30 de Outubro de 2025