A Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (Comissão Africana), reunida durante a sua 76.ª Sessão Ordinária realizada em modo virtual de 19 de Julho a 02 de Agosto de 2023:
Recordando o seu mandato de promover e proteger os direitos humanos e dos povos em África no âmbito do artigo 45.o da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (a Carta Africana);
Recordando também a obrigação dos Estados Partes na Carta Africana de tomarem todas as medidas necessárias para a implementação dos direitos contidos na Carta Africana;
Recordando ainda as disposições da Convenção da Organização da União Africana de 1969 sobre os Aspectos Específicos dos Problemas dos Refugiados em África, que apela aos Estados-membros da União Africana para que adiram à Convenção de 1951 relativa ao Estatuto dos Refugiados e ao seu Protocolo de 1967 e apliquem aos refugiados em África os direitos concedidos aos refugiados ao abrigo destes instrumentos, incluindo o exercício mais amplo possível dos seus direitos e liberdades fundamentais;
Considerando a Convenção de 1954 relativa ao Estatuto dos Apátridas (Convenção de 1954) e a Convenção de 1961 para a Redução dos Casos de Apatridia (Convenção de 1961), que exigem que os Estados protejam e respeitem o estatuto pessoal de um apátrida e os direitos daí decorrentes;
Tendo em conta as disposições da Convenção da União Africana para a Protecção e Assistência às Pessoas Deslocadas Internamente em África (Convenção de Kampala), que consagra o respeito e a protecção dos princípios da humanidade e da dignidade humana e dos direitos humanos das pessoas deslocadas internamente, incluindo a não-discriminação e a igualdade, promovendo a autos-suficiência e meios de subsistência sustentáveis entre as pessoas deslocadas internamente;
Recordando as disposições da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, do Protocolo à Carta Africana dos Direitos da Mulher em África (Protocolo de Maputo) e da Carta Africana dos Direitos e do Bem-Estar da Criança;
Recordando também as disposições dos vários instrumentos internacionais em matéria de direitos humanos, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a Convenção sobre os Direitos da Criança, a Convenção das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW) e o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, que promovem os princípios da não-discriminação e da igualdade para todos em todos os domínios;
Considerando as suas resoluções ACHPR/Res.114(XXXXII) 07 sobre migração e direitos humanos, ACHPR/RES.333(EXT.OS/XIX) 2016 sobre a situação dos migrantes em África, ACHPR/Res.369(LX) 2017 sobre a situação dos deslocados internos em África; ACHPR/Res.470 (LXVII) 2020 sobre a protecção dos refugiados, requerentes de asilo, pessoas deslocadas e migrantes na luta contra a pandemia da COVID-19 em África; ACHPR/Res. 484 (EXT.OS/XXXIII) 2021 sobre o respeito pelo princípio da não-repulsão dos requerentes de asilo e refugiados; e ACHPR/Res. 491 (LXIX) 2021: Resolução sobre as alterações climáticas e o deslocamento forçado em África.
Considerando também que as disposições do Pacto Global para uma Migração Segura, Ordenada e Regular e do Pacto Global para os Refugiados visam promover a protecção e a realização dos direitos sociais e económicos de todos os migrantes, pessoas deslocadas à força e apátridas;
Reafirmando a Declaração solene de Kampala sobre Refugiados, Repatriados e Pessoas Deslocadas Internamente, de 23 de outubro de 2009, sobre a Protecção Efectiva das Vítimas de Deslocações Forçadas (parágrafo 10), que compromete a União Africana a criar um ambiente favorável aos refugiados e às pessoas deslocadas internamente;
Considerando o ónus desproporcionado que recai sobre os Estados africanos para acolher e cuidar dos refugiados, requerentes de asilo, pessoas deslocadas internamente e apátridas;
Preocupada com a situação de cerca de 40 milhões de refugiados, requerentes de asilo, pessoas deslocadas internamente e apátridas em África, e com o número crescente de novas emergências humanitárias complexas e situações de deslocação forçada prolongada;
Preocupada, além disso, com o aumento constante das necessidades humanitárias na ausência de financiamento adequado, o que tem um impacto negativo nos esforços e na capacidade dos Estados para integrar as pessoas deslocadas e apátridas;
Reconhecendo que a inclusão de refugiados, requerentes de asilo, pessoas deslocadas internamente e apátridas nos sistemas socioeconómicos nacionais lhes permite ter uma vida digna, aceder aos serviços públicos e contribuir plenamente para as economias locais dos países de acolhimento;
Encorajada pelas acções positivas iniciadas por vários países do continente que adoptaram medidas legislativas e administrativas para incorporar os instrumentos internacionais e regionais relativos aos refugiados e aos direitos humanos, a fim de tornar efectivos os direitos dos refugiados, dos requerentes de asilo, das pessoas deslocadas internamente e dos apátridas;
Reafirmando a Posição Comum Africana sobre a Eficácia da Ajuda Humanitária, que apela a que sejam tomadas medidas específicas para integrar as necessidades humanitárias e as questões de deslocação nos planos de desenvolvimento nacionais e locais (número 59), bem como a necessidade de ancorar a acção humanitária em estratégias e planos inclusivos adequados; e a implementação de medidas específicas para reforçar uma abordagem inclusiva que integre as dimensões humanitárias nos planos de desenvolvimento locais, nacionais e regionais (número 78);
Tendo em conta a necessidade de identificar situações mistas, a fim de assegurar um envolvimento precoce e uma maior participação dos governos e dos actores do desenvolvimento na reintegração dos refugiados;
Grata pela lendária hospitalidade e generosidade dos Estados e povos africanos, em particular das comunidades locais de acolhimento, de acordo com os princípios do pan-africanismo e o espírito do Ubuntu,
A Comissão convida os Estados-Membros a:
1. Ratificar, integrar, divulgar e aplicar os diferentes instrumentos regionais e internacionais em matéria de direitos humanos relativos aos refugiados, aos deslocados internos e aos apátridas;
2. Adoptar medidas legislativas, administrativas e outras para permitir que as pessoas deslocadas à força e os apátridas beneficiem de direitos socioeconómicos e outros;
3. Colaborar com as instituições sub-regionais, regionais e internacionais que protegem e assistem as pessoas deslocadas à força e os apátridas, em especial o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), a fim de facilitar a assimilação e a integração dos apátridas e dos refugiados como solução duradoura para os refugiados de longa duração;
4. Apoiar, integrar e aplicar, a nível nacional e local, as resoluções, declarações e estratégias adoptadas pela União Africana, a Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, as Comunidades Económicas Regionais e os mecanismos regionais relativos à inclusão das pessoas deslocadas à força e apátridas;
5. Conceber, divulgar e aplicar planos de acção para a protecção, a promoção e o respeito dos direitos das pessoas deslocadas à força e apátridas, bem como quadros de responsabilização para acompanhar os progressos, através do levantamento dos sistemas e das políticas, com vista a identificar as lacunas que limitam a inclusão social e económica das pessoas deslocadas e apátridas;
6. Trabalhar no sentido de erradicar a discriminação, a exploração e os abusos, a marginalização, os ataques/atitudes xenófobos, a violência e a estigmatização e o racismo contra as pessoas deslocadas à força, apátridas e refugiados, com vista a criar um ambiente propício à integração de todos, incluindo as pessoas com deficiência.
7. Eliminar as restrições que impedem a inclusão social e económica das pessoas deslocadas à força e apátridas em contextos urbanos e rurais, promovendo esforços para atenuar os impactos jurídicos, sociais, económicos e ambientais das deslocações prolongadas através de intervenções multidimensionais, incluindo:
a. Facilitar o acesso aos documentos de refugiado e o seu reconhecimento, sensibilizando os funcionários dos serviços de imigração, saúde, educação, polícia, registo civil e outros, bem como os membros do sistema judicial, para o respeito e a igualdade de tratamento das pessoas deslocadas à força e apátridas;
b. Combater a separação das famílias e os traumas daí resultantes, garantindo o acesso efectivo aos serviços públicos e às oportunidades económicas, a liberdade de circulação e a escolha de residência no país;
c. Sensibilizar as instituições públicas e privadas para as questões da deslocação forçada e da apatridia, nomeadamente no que diz respeito aos deveres e direitos dos refugiados, dos requerentes de asilo, das pessoas deslocadas à força e dos apátridas, reforçando a participação das pessoas deslocadas à força e dos apátridas nos programas e nas decisões que têm impacto nas suas vidas;
8. Incluir os refugiados e os apátridas nos esforços nacionais para atingir os objectivos de desenvolvimento sustentável, nomeadamente nos planos de recuperação económica e de desenvolvimento local, nos planos nacionais para sistemas alimentares sustentáveis e nos planos nacionais de adaptação (PNA), e alargar a presença dos serviços técnicos governamentais, incluindo os serviços de extensão agrícola, nas zonas de acolhimento de refugiados;
Feita em modo virtual, aos 02 de Agosto de 2023