O dia 25 de Abril assinala o Dia da Prisão Preventiva em África inaugural, o que aumenta a divulgação da situação de milhares de pessoas que são detidas em África por períodos prolongados em celas policiais e prisões, sem julgamento. Esta data foi escolhida para coincidir com a adopção pela Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos das Directrizes sobre as Condições de Detenção, Custódia Policial e Prisão Preventiva (‘as Directrizes de Luanda’), que oferecem um modelo aos Estados-parte para reforçarem as suas práticas e sistemas nacionais em termos de detenção, custódia policial e prisão preventiva. As Directrizes de Luanda reforçam a importância dos sistemas de justiça penal assentes nos princípios basilares dos direitos humanos.
Completam-se nesta data 10 anos desde que estas linhas essenciais que permitem garantir uma detenção e/ou prisão nos marcos da lei e com respeito aos direitos humanos, foram adoptadas.
Nessa altura, em 2016, o saudoso Comissário Kaggwa, Relator Especial para este Mecanismo afirmava e citamos:
“As directrizes reflectem as aspirações colectivas dos nossos estados, instituições nacionais dos direitos humanos e organizações da sociedade civil em promover uma abordagem a esta área crítica da justiça penal baseada nos direitos”, fim de citação. Esta afirmação mantém-se actual e actuante.
Hoje, o continente africano, continua a registar números elevados de reclusos em prisão preventiva, com uma média que oscila acima dos 50% da população prisional.
Para muitas destas pessoas em prisão preventiva, o direito a um julgamento justo é difícil. A falta de representação jurídica acessível, fianças inacessíveis, detenção e custódia policial no caso de crimes menores, e a detenção de pessoas que não constituem ameaça para a sociedade, significa que muitos detidos podem esperar anos até comparecerem em tribunal. Cada dia passado em prisão preventiva significa que o detido fica privado de possíveis oportunidades de trabalhar e de cuidar dos seus familiares e está exposto a condições de detenção que colocam sérios riscos à sua pessoa e saúde. Ao abordar o aspecto da justiça relacionado com a prisão preventiva, apoiar-se-ão as metas de desenvolvimento, na medida em que, em todo o continente africano, a prisão preventiva arbitrária e prolongada atinge com maior significância as camadas mais pobres e marginalizadas, entre as quais as mulheres e raparigas.
Esta verdade ficou demonstrada, a nível do continente e não só, durante a pandemia da Covid-19 e constitui um dado a ter em linha de observação permanente, por parte de todos os actores que trabalham com esta matéria.
O recurso desnecessário e arbitrário à prisão preventiva e à detenção e custódia policial, são os factores que mais contribuem para a superlotação das prisões, uma correlação já fixada ao longo dos vários trabalhados efectuados a respeito. A detenção prolongada e arbitrária também alimenta a corrupção, expõe os detidos ao risco de violação grave dos direitos humanos – quer na forma de tortura ou maus tratos – e tem um impacto socio-económico significativo sobre as pessoas detidas, os seus familiares e as comunidades.
O Dia da Prisão Preventiva em África proporciona a todos uma oportunidade para reflictir sobre os desafios da prisão preventiva, as suas consequências pessoais e colectivas, bem como o seu peso para as despesas públicas e isso permite que se comprometam a implementar e a monitorar as Directrrizes de Luanda no respectivo contexto nacional.
As autoridades legislativas podem usar as Directrizes como elemento auxiliar na avaliação das circunstâncias a ter em linha de conta, na fase de discussão e decisão sobre as normas que versem sobre a detenção e prisão, que normalmente constituem reservas absolutas desse órgão.
As autoridades judiciárias podem contribuir para a aplicação efectiva destas Directrizes, na tomada de decisões sobre a manutenção de prisão efectiva, em fase de instrução preparatória dos processos-crime, usando medidas alternativas à prisão e com menor impacto económico-social nas famílias e no orçamento do Estado, influenciando desta forma o ingresso de mais pessoas no sistema prisional.
Os governos nacionais podem usar as Directrizes de Luanda como modelo, face ao qual podem fazer ou propor a revisão das leis, práticas e políticas nacionais vigentes.
As autoridades de fiscalização e a sociedade civil também desempenham um papel importante na monitorização, comunicação de dados e relatórios, sensibilização e fornecimento de assistência técnica aos governos, de modo a promover sistemas de detenção, custódia policial e prisão preventiva que sejam justos, baseados nos princípios fundamentais dos direitos humanos.
Depois de 10 anos de existência, a Comissão centra a sua atenção na advocacia para a internalização das Directrizes nas leis nacionais e na sua inserção em todos os níveis de formação dos agentes responsáveis pela aplicação da lei. Este deve constituir o desafio a assumir para os próximos tempos.
Do mesmo modo, a Comissão alerta para o novo grupo de pessoas que ingressam de forma massiva nas prisões em África, constituído por adversários políticos na oposição e jornalistas no exercício da liberdade de expressão e direito de difundir suas opiniões, exarcebando ainda mais a precariedade das condições de detenção.
Por fim, a Comissão vai continuar a advocacia para que o instrumento regional sobre os Direitos dos Prisioneiros retorne às discussões dos órgãos da União Africana, nos próximos tempos.
Para o ano 2024 e em alusão aos 10 anos das Directrizes, convida-se todos os actores-chave que trabalham nestas matérias, organizem sessões de trabalho para avaliar o resutado e o impacto da aplicação das Directrizes de Luanda no seu território, para em Dezembro permitir a conclusão desta comemoração.
Relatora Especial para as Prisões, Condições de Detenção e Acção Policial em África
Maria Teresa Manuela
Comissária