Desenvolvimento de um quadro jurídico específico para a protecção das pessoas deslocadas à força em África em consequência das alterações climáticas - CADHP/Res.628 (LXXXII) 2025

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A Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (a Comissão Africana), reunida na sua 82.ª Sessão Ordinária, realizada de 25 de Fevereiro a 11 de Março de 2025 (virtualmente);

Recordando o seu mandato de promoção e protecção dos direitos humanos e dos povos em África, nos termos do artigo 45.º da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (Carta Africana), em particular o n.º 1/a, que mandata a Comissão Africana a recolher documentação, realizar estudos e investigações sobre os problemas africanos no domínio dos direitos humanos e dos povos;

Recordando ainda, em particular, as suas Resoluções DACHP/Res.153 (XLVI) 09 sobre alterações climáticas e direitos humanos e a necessidade de realizar um estudo sobre o seu impacto em África; DACHP/Res.271 (LV) 14 sobre as alterações climáticas em África; DACHP/Res. 342(LVIII) 2016 sobre alterações climáticas e direitos humanos em África; DACHP/Res.369 (LX) 2017 sobre a situação das pessoas deslocadas internamente em África; ACHPR/Res.568 (LXXVII) 2023 sobre o compromisso da CADHP de acompanhar os Estados na procura de soluções duradouras com vista a reduzir e acabar com a deslocação forçada de pessoas e as suas consequências em África; e ACHPR.Res.582 (LXXVIII) 2024 sobre a necessidade de tomar medidas para reduzir a deslocação interna forçada em África;

Considerando os Princípios Orientadores Africanos sobre os Direitos Humanos de Todos os Migrantes, Refugiados e Requerentes de Asilo, adoptados pela Comissão Africana em 2023, em particular o Princípio 32, que recorda aos Estados a necessidade de reconhecer os efeitos adversos e extraterritoriais das alterações climáticas como motores da deslocação e da migração climáticas; 

Considerando também a Estratégia e o Plano de Ação para um Desenvolvimento Resiliente às Alterações Climáticas em África (2022-2032), que visa fazer face às consequências negativas das alterações climáticas;

Recordando a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (1992), o Protocolo de Quioto à Convenção (1997) e o Acordo de Paris (2015) adotado na COP. 21, que estabelecem que é da responsabilidade dos Estados preservar o sistema climático em benefício das gerações presentes e futuras, com base na equidade e de acordo com as suas responsabilidades comuns, mas diferenciadas, e respetivas capacidades;

Reafirmando que a África, apesar de contribuir apenas com cerca de 4% das emissões globais de gases com efeito de estufa, é particularmente vulnerável às alterações climáticas e que os efeitos das alterações climáticas continuam a ser uma das principais ameaças à paz e à segurança sustentáveis em África;
Considerando a vulnerabilidade da África às alterações climáticas e o facto de o acesso aos recursos naturais, como a água, poder ser uma causa crescente de conflitos no continente;

Preocupada com o aumento constante do número de deslocações forçadas no continente em consequência de catástrofes naturais como inundações, tempestades, ciclones e secas, principalmente devido às alterações climáticas, que afectam em particular a agricultura e a disponibilidade de recursos hídricos e agravam a insegurança alimentar e certos conflitos intercomunitários;

Recordando que, apesar da recente evolução da jurisprudência, a categoria de "refugiado climático" ainda não foi consagrada no direito positivo, nem internacional nem regional, uma vez que as razões relacionadas com o clima não conferem às pessoas o direito de asilo, privando assim milhões de pessoas da protecção internacional de que necessitam; 

Tomando em consideração as iniciativas de muitos intervenientes e peritos sobre a possibilidade de aplicar o critério de "acontecimentos que perturbem gravemente a ordem pública" ao abrigo da Convenção da OUA de 1969, que rege os aspectos específicos dos problemas dos refugiados em África no contexto das deslocações relacionadas com as alterações climáticas, em particular a série de estudos de investigação lançados pelo Alto Comissariado para os Refugiados, que inclui uma avaliação da Convenção da OUA de 1969 no contexto das catástrofes, da degradação ambiental e dos efeitos adversos das alterações climáticas;

Convencidos de que a proposta de uma definição juridicamente sólida de "refugiado climático", baseada na legislação africana existente em matéria de refugiados, preencherá a lacuna jurídica neste domínio, proporcionará a protecção necessária a muitas pessoas e confirmará a liderança africana nesta matéria;  

Conscientes também da complexidade das relações entre os efeitos adversos das alterações climáticas e a deslocação forçada de pessoas; 

Tendo em conta o papel da Comissão, nos termos do nº 1, alínea b), do artigo 45º da Carta Africana, que lhe confere poderes para "formular e elaborar, com vista a servir de base para a adoção de legislação pelos governos africanos, princípios e regras para a solução de problemas jurídicos relacionados com o gozo dos direitos humanos e dos povos e das liberdades fundamentais";

A Comissão:
1.    Reconhece a necessidade urgente de responder aos problemas emergentes, nomeadamente através da criação de um quadro de protecção jurídica para as pessoas deslocadas devido às alterações climáticas, sobretudo quando estas procuram refúgio fora das fronteiras dos seus países, mas também através do desenvolvimento de uma posição comum africana, baseada nos direitos humanos, a fim de responder às consequências das alterações climáticas na mobilidade das pessoas no continente;
2.    Decide realizar um estudo sobre o desenvolvimento de um quadro jurídico específico para a protecção das pessoas deslocadas à força em África em consequência das alterações climáticas;
3.    Solicita ao Relator Especial para os Refugiados, os Requerentes de Asilo, as Pessoas Deslocadas e os Migrantes em África que realize o referido estudo; 
4.    Convida os actores estatais e não estatais a apoiar o estudo a realizar.

Elaborado virtualmente em 11 de Março de 2025