Declaração do 1º Fórum Conjunto dos Mecanismos Especiais da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos

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1.º FÓRUM CONJUNTO DOS MECANISMOS ESPECIAIS DA COMISSÃO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS

PREÂMBULO

CONSIDERANDO que a Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (a Comissão) convocou o Fórum Conjunto inaugural dos Mecanismos Especiais da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.

Os objectivos do Fórum eram os seguintes:

i. Reflectir sobre o estado dos direitos humanos no continente, avaliar os ganhos, identificar os principais desafios e, em conjunto, determinar como a Comissão pode contribuir melhor para a protecção e promoção dos direitos humanos no continente, particularmente no contexto da agenda de direitos humanos e governação da União Africana.
ii. Analisar e reflectir sobre os progressos realizados pela Comissão na defesa dos direitos humanos, reconhecendo as realizações e compreendendo os obstáculos enfrentados pelos seus mecanismos especiais e as possíveis estratégias para melhorar a sua eficácia.
iii. Avaliar de forma crítica o estado da ratificação e aplicação dos instrumentos de direitos humanos, identificando lacunas e promovendo acções para reforçar a proteção e a promoção dos direitos humanos.
iv. Fomentar o intercâmbio de experiências, através da promoção de parcerias que permitam colmatar o fosso entre as aspirações e as realidades no terreno.

O Fórum interactivo centrou-se nas seguintes questões temáticas:

i. O ponto de situação da ratificação de instrumentos de direitos humanos.
ii. Impulsionar a protecção e a promoção dos direitos humanos e dos povos no âmbito da UA.
iii. Discussões interactivas sobre os instrumentos regionais, as leis não vinculativas e a jurisprudência da Comissão e seu impacto.

CONSIDERANDO ainda que o Fórum Conjunto contou com 119 participantes, incluindo: 11 Comissários, 23 representantes dos Estados Partes, 11 Órgãos da UA, Departamentos e Instituições Especializadas, 4 representantes de organizações internacionais, 14 representantes de Instituições Nacionais de Direitos Humanos (INDHs), 16 representantes de Organizações da Sociedade Civil (OSC), 9 da Academia, para além de 31 funcionários do Secretariado da Comissão.

CONSIDERANDO também que os debates da sessão do Fórum incluíram o seguinte: uma apresentação da Comissão e dos seus mecanismos especiais; o mapeamento do progresso e a ratificação e implementação de instrumentos regionais de direitos humanos; o intercâmbio de experiências sobre a ratificação pelos Estados Partes; debates sobre o impacto e os desafios das leis não vinculativas e da jurisprudência da Comissão; o seu procedimento de apresentação de relatórios e directrizes para promover relatórios estatais em conformidade com os instrumentos de direitos humanos; além de debates à mesa para reforçar o diálogo interativo entre os participantes no Fórum.

NOTANDO que as seguintes áreas de preocupação foram levantadas pelos Participantes:

A lentidão da ratificação de instrumentos de direitos humanos.
Lacunas na implementação e aplicação dos instrumentos ratificados por várias razões, tais como normas e barreiras culturais, resistência política, recursos limitados e falta de conhecimento ou entendimento.
Reservas feitas sobre alguns instrumentos que impedem a plena realização dos direitos humanos consagrados. 
Falta de sensibilização dos cidadãos sobre os instrumentos de direitos humanos que o Estado pretende ratificar e as questões que serão abordadas neles.
Lacuna de conhecimento entre os funcionários do governo sobre os instrumentos que foram adoptados pelo seu Estado.
Falta de conclusão e adopção de alguns relatórios sobre violações graves e maciças dos direitos humanos pela Comissão.
Falha das instituições de direitos humanos em denunciar violações de direitos humanos.
Equívocos sobre as obrigações dos Estados decorrentes de instrumentos de direitos humanos.
Retirada de declarações que permitem que indivíduos e Organizações Não Governamentais tenham acesso directo ao Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos (o Tribunal Africano).
Conflitos armados persistentes em vários países e os efeitos negativos sobre as populações, incluindo, entre outros, o deslocamento interno.
Encolhimento do espaço cívico e aumento da repressão de activistas de direitos humanos.
Falta de conhecimento das leis não vinculativas da Comissão por juízes e advogados a nível nacional.
O estado contencioso das leis não vinculativas no direito internacional.
Visibilidade e utilização limitadas dos instrumentos jurídicos regionais e das leis não vinculativas a nível nacional.
Recursos humanos, materiais e financeiros limitados para garantir uma monitorização e acompanhamento eficazes no Secretariado da Comissão.
Baixa taxa de Estados que cumprem as obrigações de apresentação de relatórios.
Obstáculos linguísticos e culturais à participação efectiva dos cidadãos.
O acesso limitado à Internet no continente, fora das zonas urbanas e por parte de grupos vulneráveis.
A polarização das redes sociais e o aumento do discurso de ódio, da desinformação, etc.
O aumento do desafio da proteção de dados.
A falta de critérios para a rejeição de pedidos de estatuto de observador.

POR CONSEGUINTE, o Fórum faz as recomendações abaixo às seguintes partes interessadas:

A. AOS ESTADOS PARTES

Os Estados Partes devem:

i. Garantir a ratificação universal e a domesticação de todos os instrumentos de direitos humanos, em particular os Protocolos à Carta Africana sobre os Direitos da Mulher em África, os Direitos das Pessoas Idosas, os Direitos das Pessoas com Deficiência, os Direitos dos Cidadãos à Protecção Social e à Segurança Social, e o Protocolo relativo a aspectos específicos do direito à nacionalidade e à erradicação da apatridia.
ii. Criar mecanismos nacionais, como mecanismos interministeriais, para defender a ratificação e implementação de instrumentos de direitos humanos a nível nacional.
iii. Garantir que os Planos de Acção Nacionais sobre direitos humanos incluam a ratificação e implementação de instrumentos de direitos humanos. 
iv. Garantir a apresentação de relatórios consistentes à Comissão, destacando quaisquer desafios na ratificação e implementação. 
v. Criar mecanismos que monitorem de forma holística a aplicação das recomendações formuladas pelos diferentes mecanismos de direitos humanos.
vi. Incluir nos currículos escolares a educação sobre os instrumentos regionais e as leis não vinculativas.
vii. Incorporar os princípios dos documentos jurídicos não vinculativos relevantes em leis vinculativas.
viii. Criar centros de informação acessíveis aos cidadãos, onde seja possível ter acesso aos instrumentos regionais e às leis não vinculativas relevantes em papel e em formato electrónico.
ix. Desenvolver conjuntos de ferramentas sobre documentos jurídicos não vinculativos, para melhorar a sua utilização.
x. Sensibilizar os estudantes de direito, os advogados e os juízes para os instrumentos regionais, bem como para as leis não vinculativas elaboradas pelos mecanismos regionais de direitos humanos.
xi. Assegurar recursos humanos e financeiros adequados para os mecanismos especiais da Comissão.
xii. Integrar uma abordagem baseada nos direitos humanos, centrada nos princípios de igualdade, não discriminação e participação, em todas as políticas, planos e programas do Estado, para garantir que os direitos humanos estejam no centro do desenvolvimento.
xiii. Assegurar a proteção do espaço cívico, que oferece oportunidades de participação dos cidadãos, dado que este é um pilar fundamental da democracia.
xiv. Assegurar que os relatórios periódicos incluam contribuições das INDH e das OSC.

B. À COMISSÃO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS

A Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos deve:

i. Garantir a implementação efectiva da complementaridade com o Tribunal Africano, o que contribuirá para a crescente jurisprudência em matéria de direitos humanos e para o reforço dos direitos humanos e do Estado de direito em África.
ii.Colaborar com o Tribunal Africano e o Comité Africano de Peritos sobre os Direitos e Bem-Estar da Criança em seminários conjuntos de sensibilização sobre a ratificação de instrumentos de direitos humanos. 
iii.Reforçar as sinergias com outros órgãos de direitos humanos da UA que monitoram a implementação de instrumentos de direitos humanos para reduzir os encargos de relatórios para os Estados Partes.
iv.Reforçar a participação dos jovens, da mulher e de outros grupos vulneráveis.
v.Reforçar a utilização e o investimento em tecnologia, especialmente na actual era digital, a fim de reforçar o mandato de protecção da Comissão.
vi.Encetar um diálogo com o sector privado, incluindo as indústrias extractivas, para resolver os conflitos devastadores alimentados pelas suas actividades no continente.
vii.Concentrar-se na revisão independente dos direitos humanos e da democracia nos Estados Partes, para garantir que as metas da Agenda 2063 sejam cumpridas.
viii.Monitorar e auxiliar os Estados na aplicação dos instrumentos regionais e das leis não vinculativos.
ix.Divulgar os instrumentos regionais e as leis não vinculativas junto dos actores nacionais, incluindo juízes e advogados.
x.Reforçar a sua rede com as partes interessadas nacionais através da colaboração com intervenientes estatais e não estatais, incluindo os Ministérios e as Comissões Parlamentares relevantes, o poder judicial, as INDHs, as OSC, as instituições académicas e os meios de comunicação social.
xi.Elaborar um compêndio de instrumentos jurídicos não vinculativos, a fim de reforçar a sua acessibilidade.
xii.Desenvolver versões abreviadas de documentos jurídicos não vinculativos, que sejam mais fáceis de utilizar.
xiii.Assegurar uma divulgação coerente dos instrumentos regionais e dos instrumentos jurídicos não vinculativos, aquando da celebração dos dias internacionais e regionais dos direitos humanos. 
xiv.Liderar o desenvolvimento de currículos a nível estatal, para garantir que os princípios dos direitos humanos sejam incorporados nos programas de educação.
xv.Reforçar a participação dos cidadãos na responsabilização dos Estados pelas obrigações em matéria de direitos humanos.
xvi.Facilitar a participação directa dos cidadãos, com direito a voz, nas sessões públicas da Comissão.

C. AOS ÓRGÃOS/DEPARTAMENTOS DA UNIÃO AFRICANA COM MANDATO EM MATÉRIA DE DIREITOS HUMANOS

i.Incentivar a ratificação e implementação de instrumentos de direitos humanos.
ii.Garantir sinergia na disseminação de instrumentos regionais de direitos humanos entre todos os Órgãos e departamentos.

D. ÀS INSTITUIÇÕES NACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS

As Instituições Nacionais de Direitos Humanos devem:

i.Colaborar com a Comissão na divulgação dos seus instrumentos regionais e leis não vinculativas.
ii.Integrar no seu trabalho a divulgação dos instrumentos jurídicos não vinculativos da Comissão.
iii.Realizar iniciativas com a Comissão, a fim de reforçar as sinergias em matéria de promoção e protecção dos direitos humanos.  
iv.    Assegurar a descentralização dos gabinetes e dos serviços das INDH, a fim de melhorar o acesso dos cidadãos.
v.Apresentar de forma consistente relatórios-sombra sobre os relatórios periódicos dos Estados Partes.
vi.Orientar os indivíduos e as comunidades que desejem participar diretamente, dando-lhes a palavra, nas sessões públicas da Comissão.

E. ÀS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL

As Organizações da Sociedade Civil devem:

i.Apresentar casos de violações dos direitos humanos à Comissão em nome dos cidadãos lesados.
ii.Assegurar que as organizações da sociedade civil que defendem os direitos dos grupos vulneráveis, como as mulheres, as pessoas com deficiência, entre outros, apresentem suas candidaturas ao estatuto de observador junto da Comissão, a fim de melhorar o seu acesso junto desta.  
iii.Defender o cumprimento pelos Estados de suas obrigações nos termos dos instrumentos de direitos humanos.
iv.Colaborar com os Estados na concepção e execução de programas de assistência a grupos vulneráveis.
v.Divulgar os instrumentos regionais e as leis não vinculativas entre as organizações de base e a população.
vi.Integrar os instrumentos regionais e as leis não vinculativas nos planos de advocacia e nos litígios a nível interno.
vii.Tornar-se defensores dos instrumentos regionais e das leis não vinculativas a nível local.
viii.Apresentar de forma coerente relatórios-sombra sobre os relatórios periódicos dos Estados Partes, assegurando a participação dos cidadãos na elaboração dos relatórios.
ix.Orientar os indivíduos e as comunidades que desejem participar diretamente, dando-lhes a palavra, nas sessões públicas da Comissão.

F. AOS PARCEIROS INTERNACIONAIS

Os Parceiros Internacionais devem:

i.Fornecer aos Estados Partes o apoio adequado para a implementação e disseminação de instrumentos regionais de direitos humanos.
ii.Auxiliar os Estados Partes a traduzirem os instrumentos regionais e as leis não vinculativas para as línguas locais faladas nos vários Estados Partes.
iii.Estabelecer parcerias com os membros da Plataforma da Arquitetura de Governação Africana para assegurar a transformação digital do seu trabalho, como forma de melhorar a participação dos cidadãos.

G. AOS ÓRGÃOS JUDICIAIS E PARA-JUDICIAIS

i.Inspirar-se na jurisprudência dos mecanismos africanos de direitos humanos.
ii.Utilizar os instrumentos regionais e as leis não vinculativas dos organismos regionais de defesa dos direitos humanos, principalmente os juristas.

H. ÀS INSTITUIÇÕES ACADÉMICAS

i.Desenvolver um compêndio de jurisprudência dos órgãos regionais de direitos humanos.
ii.Realizar pesquisas em áreas-chave para reforçar a participação dos cidadãos a todos os níveis.  

Redigida em Dakar, Senegal, aos 27 de Abril de 2024

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